Excursão ao complexo de Auschwitz
O dia amanheceu bem cinzento. A sensação monocromática e serena que cobria Cracóvia parecia uma ambientação intencional para o principal passeio daquela quarta-feira. Conheceríamos os campos de concentração e de extermínio de Auschwitz, a representação mais perversa do Holocausto.
Entre 1940 e 1945, os nazistas deportaram pelo menos 1.300.000 pessoas para Auschwitz. Desse montante, por volta de 1.100.000 eram judeus, 150.000 eram poloneses, 23.000 eram ciganos, 15.000 eram prisioneiros de guerra soviéticos e os demais pertenciam a outros grupos étnicos. Cerca de 1.100.000 prisioneiros morreram por lá. Dessas vítimas, 90% eram judeus, assassinados, em sua maioria, nas câmaras de gás.
Várias empresas fazem a excursão ao complexo de Auschwitz. Adquirimos os pacotes ainda no Brasil, pela Krakow Shuttle. Como também comprou o transfer do aeroporto para o hotel pela mesma empresa, ao final da operação, recebeu um desconto de 10% por todos os serviços. Para mais informações, acesse krakowshuttle.com.
O micro-ônibus nos buscou na porta do hotel às 9h. Às 11h, já estávamos em Auschwitz I, conhecido como Stammlager, campo principal e centro administrativo do complexo, parte do Auschwitz-Birkenau Memorial and Museum. Foi inaugurado em 20 de maio de 1940.
A frase “Arbeit macht frei” (O trabalho liberta), disposta no portão da entrada principal, incita uma certa indignação nos visitantes. Há quem a interprete como zombaria ou falsa promessa de liberdade para os prisioneiros que trabalhassem no campo até a exaustão. Mas Rudolf Höss, que comandou Auschwitz I de maio de 1940 a novembro de 1943 e ordenou a fixação da inscrição no local, acreditava que se sacrificar no trabalho sem fim era uma forma de se liberar espiritualmente. Sem comentários.
Nosso passeio foi conduzido pela guia Illona Kapcza. Havia muita emoção no tom com que informava sobre cada espaço e cada acontecimento. Em momento algum, era possível identificar, em seu discurso, uma atitude ensaiada. A melancolia de suas expressões, as mãos postas e a voz aparentemente embargada comoviam a todos.
Stammlager serviu, basicamente, para utilização de trabalho forçado. Apenas 300 de seus prisioneiros conseguiram fugir, ao passo que outros 70 mil, divididos em poloneses e soviéticos, morreram no local. Nesse campo, também foram efetuados os primeiros experimentos com câmara de gás utilizando o pesticida Zyklon-B, uma substância à base de ácido cianídrico, cloro e nitrogênio. O primeiro teste, ocorrido em 1941, matou 850 pessoas.
Os edifícios dos blocos 4, 5, 6, 7 e 11 abrigam exposições emocionantes, com elementos originais ou parcialmente reconstruídos. A riquíssima coleção é formada de cômodos, móveis, fotografias, fotocópias, documentos, modelos, vestimentas, objetos, entre outros. A intensidade dos fatos exibidos parece não permitir ao visitante vislumbrar um instante isento de crueldade. A história é literalmente materializada quando se chega às salas onde estão os pertences apreendidos dos judeus. Os relatos, que até então sobrepuseram barbárie sobre barbárie, parecem ter sido incorporados em acessórios pessoais. Amontoados de calçados, de pares de óculos, de escovas de barbear e de engraxar, de muletas e de pernas mecânicas deixam os visitantes perplexos.
Os prisioneiros que chegavam a Auschwitz recebiam a instrução de identificar suas malas, iludidos pelos soldados da SS de que recuperariam seus pertences assim que fossem libertados. Mal sabiam essas vítimas de que tudo o que tinham logo seria apropriado pelos nazistas. No museu, a espera eterna daquelas bagagens vazias pelos seus donos é a mais perfeita simbologia de vidas extorquidas.
É impossível olhar para cada objeto sem personificar um proprietário e imaginar a dimensão do seu sofrimento. Tal associação ganha força quando se passa pela enorme sala onde estão os emaranhados de cabelos humanos. Não é permitido fotografar o espaço. A foto abaixo foi retirada do site do museu.
No final da guerra, ao libertar os prisioneiros de Auschwitz, o exército soviético encontrou sete toneladas de cabelos empacotados em sacos de papel, que representavam apenas uma pequena fração dos cabelos que foram cortados dos judeus mortos na câmara de gás. O restante dos fios havia sido enviado para confecção de tecidos e produtos manufaturados como meias, mantas e redes de cabelo.
Deixamos Auschwitz I e retornamos ao micro-ônibus, que nos levou até Auschwitz II, 0 campo de extermínio do complexo. Também conhecido como Birkenau, ali foram executados mais de 1.000.000 de judeus e ciganos. Começou a ser construído em outubro de 1941, a fim de descongestionar Stammlager.
Para os nazistas, Auschwitz II era a "solução final para o problema judeu". O trilho de trem que atravessa a entrada do campo direciona os visitantes até a réplica de um vagão que era utilizado para transportar as vítimas. O primeiro comboio chegou àquele campo em 1942, seguido de vários outros que desembarcavam diariamente trazendo judeus de quase toda a Europa.
As vítimas eram transportadas em condições sub-humanas, sem lugar para se assentar e sem comida. Havia um balde com água para saciar a sede e outro que servia como privada. Não sabiam sequer para onde estavam sendo levadas. A viagem poderia durar dias, e, no trajeto, muitos morriam doentes, com fome ou sufocados.
A réplica do vagão marca o ponto onde os judeus desembarcavam. Durante o Holocausto, era possível ver dali uma enorme coluna de fumaça que se propagava pelo céu de Birkenau, resultante da incineração dos corpos já executados nas câmaras de gás. Famintos, cansados e quase sem esperanças, muitos prisioneiros acreditavam que, em breve, tomariam um banho quente, receberiam roupas limpas e seriam alimentados com sopa, pão, café e água, conforme encorajavam os soldados da SS. A falsa promessa foi um recurso que os nazistas utilizavam para ter maior controle sobre a enorme multidão de judeus que chegava ao campo, evitando confusões, motins ou outra forma de insurreição.
Os prisioneiros eram forçados a deixar suas bagagens para trás. Em seguida, recebiam ordens para se enfileirar. Nesse momento, os nazistas faziam a seleção de quem iria direto para as câmaras de gás e de quem permaneceria vivo temporariamente. Mais de 80% eram enviados para execução, e a maioria dos que eram poupados da morte imediata padecia de exaustão pelo trabalho forçado, de fome ou de doença.
Do vagão, observamos um aglomerado de visitantes caminhando em direção às ruínas das câmaras de gás. Isso dava uma péssima impressão! O tempo encoberto impedia que víssemos o horizonte claramente, e aquelas pessoas rumando em direção de algo que não podia ser avistado era simplesmente macabro.
Após conhecermos as ruínas das câmaras de gás e dos crematórios, passamos pelos pavilhões de madeira em que estão os alojamentos e banheiros utilizados pelas vítimas.
A excursão por Auschwitz havia chegado ao fim. Foi um dos passeios mais interessantes que já fiz na minha vida. Por seu uma atração lúgubre, muita gente prefere não fazê-lo, contudo é uma experiência e tanto! Para mais informações sobre o complexo, acesse auschwitz.org.
Para ler este relato na íntegra, acesse fuievouvoltar.com.
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COMENTÁRIOS:
Rhode Tatiane Ramos comentou 8 anos atrás
me senti como se estivesse lá também, conhecendo os dois lugares. senti o ar pesado do lugar, senti arrepios e chorei lendo seu texto. uma marca negra na historia da humanidade.
Fernando Ceron comentou 8 anos atrás
Se ja tinha vontade de visitar, agora com esse relato excelente, a curiosidade aumentou. Parabéns.
Alessandro Paiva comentou 8 anos atrás
Pessoal, muito obrigado :-) Se quiserem ver esse e outros relatos na íntegra, acessem meu blog fuievouvoltar.com. Abraço!
Telma Caramelo comentou 8 anos atrás
Parabéns pelo Post! Mas gostaria de ir além e parabenizá-lo pelo belíssimo texto do perfil. Me emocionei ao ler, pois hoje, tento despertar em minhas duas filhas o prazer em viajar, em explorar o mundo!
Rosana Oliveira comentou 8 anos atrás
Eu fiz esse passeio mês passado. .E realmente é muito interessante. ..mas fui no final do verão. ..e ver as fotos na época de inverno. .achei o máximo. .ficaram lindas. .deu vontade de voltar pra ver com a neve...nao parece, mas da pra sentir um pouco do que eles passaram. ...
Alessandro Paiva comentou 8 anos atrás
Pessoal, muito obrigado :-) Desculpe a demora ao responder, ainda estou aprendendo a "mexer" no Dubbi. Abraço!